Vamos
todos virar artistas!!!
Quando Botucatu ganhou sua
primeira Estação
de Rádio, o município, como um todo, não tinha ainda 40 mil habitantes.
Moravam na cidade pouco menos da metade disso. E alguns, entre eles,
talvez
muitos deles, cultivavam o hábito diário de freqüentar o jardim do
Bosque, à
tardezinha, para ouvir as transmissões
de programas através de serviços de alto falantes que alí funcionavam.
Como
se pode ver, a paixão do botucatuense pelos alto-falantes já vem de
longa
data. Esses serviços supriram a ausência de uma emissora de rádio da
cidade,
até o ano de 39. Davam recados, rodavam músicas, faziam oferecimentos e
discutiam os problemas da cidade. Tudo como se fossem, realmente, uma
emissora.
Concurso
para artista
No
ano de 39 existiam dois serviços no Bosque. No primeiro trabalhava
Amilcar Pupo
Aielo, e o segundo, chamado Rádio Comercial de Botucatu, tinha como
diretor o
sr. Moysés Feitosa. Tudo muito
precário, mas com estúdio fixo, microfone, toca-discos e tudo o mais do
gênero.
Diferentes, claro, dos alto-falantes volantes de hoje, porém, com as
mesmas funções.
Pois foram essas duas iniciativas a base para a busca e seleção dos
primeiros
artistas e locutores para a futura emissora.
Já
no começo do ano de 39, enquanto Olívio Nardy remetia
ao
Rio
de Janeiro os documentos exigidos
para a licença de
funcionamento, o senhor Feitosa
inventou de fazer um show para selecionar artistas para a Rádio de
Botucatu. Não
teve muita dificuldade pois a nova mania, aquela de reproduzir em
Botucatu o que
se ouvia nas emissoras do Rio e de S. Paulo, já havia “dado na veia”
dos
jovens botucatuenses. Dezenas de candidatos apareceram. Então Moisés
Feitosa
escolheu uma comissão composta pelos senhores Ozório Leme, Sebastião de
Almeida Pinto, Luiz Leandro, Aldo Pace, Nelson Guimarães, Deodoro
Pinheiro
Machado, Oscarlino Martins, Francisco Vendito, Araldo Aires Monteiro e
Eulico
Mascarenhas. Com eles recebeu, no Cine Casino, daquela época (hoje
desaparecido, após incêndio) um
primeiro lote de dez candidatos e deu sinal verde apenas para 4. A
comissão
achou que estavam com condições
de enfrentar o microfone os seguintes botucatuenses: Mauro Sales (88
pontos),
Ignez Boneti (87 pontos), Moacyr de Souza (55 pontos) e Estela Silva
Pinto (54
pontos). Esses foram os primeiros.
Mas existiram mais, que a comissão classificou com menos de 50 pontos.
E, com
os selecionados, o senhor Feitosa organizou uma programação em seu
serviço de
alto-falantes, no Bosque. Seria assim: às 20,30 horas,
segunda-feiras-Nívea Ranzani (fotos), terças-Regional,
quartas-Moacir de Souza, quintas-Regional, de novo, sextas-Nívea e
Moacir.
Aos
sábados estavam reservadas as gravações com os maiores sucessos do
momento.
Tudo em discos 78 rotações. O que deveriam fazer esses artistas?
Deveriam
saber cantar, tocar instrumentos, ler e declamar corretamente,
improvisar,
enfim, tudo o que a nova emissora pudesse desejar para agradar aos
ouvintes. Foram
eles os primeiros, digamos, candidatos a artista, cantores e músicos
do nosso rádio. Alguns apareceram depois. Outros desistiram, mas muitos
continuaram, como foi o caso de Nívea Ranzani, cantora, que depois de
algum
tempo foi-se de Botucatu e fez carreira no meio artístico paulista.
Esses
programas de estúdio/alto-falantes duraram até o advento da primeira
Emissora,
em outubro de 39 e tiveram um patrocínio da “Casa Amat
que se ofereceu para patrocinar esses programas,
concorrendo assim para
que não feneça a idéa. Nesse pé, teremos para a inauguração de nossa
Estação
de Rádio um “cast” bem afiado.” Essa era uma época em que as casas
comerciais se ofereciam para patrocinar. Que diferença com os dias de
hoje,
onde um contacto publicitário tem de “matar um leão todo dia”!
O
primeiro Estúdio
Inicialmente
pensou-se instalar a Estação de Botucatu num prédio, ainda hoje
existente, em
plena praça João Pessoa, atual Praça Emílio Peduti.
Esse prédio é o mesmo que hoje abriga uma
pastelaria, e
ficou por longo tempo sendo o Bar do Radialista. Alí naquele local
também já
estava instalado o Estúdio do Serviço de Alto-falantes do senhor Moisés
Feitosa., com sua Rádio Comercial de Botucatu. Alguns dias depois de
liberada a
licença para o funcionamento da emissora, o
senhor
Olívio
Nardy, em ruidosa entrevista à Folha
de Botucatu
declarou a intenção de utilizar o “’majestoso” prédio do sr. Antonio
Aversa, esse da praça João Pessoa, da época.
Por alguma razão que se desconhece agora, a
preferência foi dada para
outro casarão, também ainda hoje existente, na confluência da Moraes
Barros
com a João Passos de hoje (antiga Cesário Alvim). Nos altos do casarão,
que
dava entrada pela Moraes Barros, adaptado
um Estúdio, foi colocada uma novíssima
mesa controladora de som ( de madeira ), importada. Nela estavam os
controles,
os pratos para rodar os 78 rotações, um rádio receptor (monitor), à
direita
e, um alto-falante à esquerda. O sistema era o mesmo que ficou longo
tempo: o
locutor também fazia a operação técnica. Dando mostras da importância
do
que estava acontecendo na cidade, antes de serem levados para os
estúdio da
Moraes Barros, os equipamentos ficaram expostos nas vitrines da antiga
Casa
Pfhaf, para deleite dos olhos e espíritos ávidos pelos sonhos que as
ondas
sonoras do Rádio propiciariam. No local dos estúdios, também foi
construído
um pequeno auditório para apresentações de duplas sertanejas e outros
cantores ou músicos e algumas salas. Nada
mais do que 30 cadeiras. E só.
A
Escolinha de Rádio do professor Angelino
Mas
o concurso para a busca de artistas, feito no início daquele ano,
revelou-se
assistemático. À direção da Emissora -espécie de gerência técnica e
geral, entregue a Olívio Nardy- pareceu
mais conveniente organizar melhor a seleção e preparação dos novos
artistas.
Em setembro, quando já era dado como certo o funcionamento da Emissora,
a direção
foi buscar aquele que lhe pareceu mais capaz para a tarefa. Residindo
novamente
em Botucatu estava o compositor Angelino de Oliveira. Andara pelo
“mundo”:
cursara Odontologia em Ribeirão Preto, mudara-se para S. Paulo e abrira
casa
comercial (bar) na Vila Mariana. De lá rumou de volta para Botucatu –
local
de sua infância – e veio trabalhar com o comércio de instrumentos
musicais.
Aqui abriu A Musical, comercializando partituras e instrumentos. Angelino, por
essa
ocasião,
já era conhecido nacionalmente com suas composições. Já tinha suas
músicas
gravadas, por vários cantores e orquestras, nos
famosos
78
rotações: em 1923 e 1926 (Tristeza do
Jeca), em 1930 (Cantando o Aboio, Cabocla
do Sertão, Incruziada), em 1931 (a modinha
Meu País), em 1931, ainda, (Tenho
Pena de Meus
Olhos), em 1936 (Lua Cheia) e a regravação famosa de Paraguassú (Tristeza do Jeca), de 1937.
E
ainda
outra regravação da Tristeza do Jeca saíria antes do final de 1939,
pela Columbia. Haveria alguém mais ligado ao meio artístico que o
compositor,
que passava o dia alí em sua loja da Amando de Barros, mais ou menos
onde hoje
está o estacionamento do Banco do Brasil. Naquele mesmo
local funcionaria posteriormente uma conhecida casa
de comércio chamada
Casa Brasileira. E antes de Angelino abrir sua A Musical funcionou alí
também
uma Papelaria chamada Art Noveau, de propriedade da família Bratke, da
forte
colônia alemã, local, e que deu ao Brasil um dos nomes mais destacados
da
arquitetura modernista; o arquiteto Oswaldo Bratke. Mas, voltemos ao
nosso
assunto, perguntando: haveria alguém mais apropriado
que Angelino para ensinar Rádio?
Pois
o Angelino foi o escolhido e começou a trabalhar. Queria interessados
para música,
canto, declamação e teatro. E uma nova leva de futuros radialistas
começou a
emergir das aulas do Angelino.
Em
outubro, depois do período de experiências, foi o Angelino convidado
para
assumir a direção artística da nova Emissora. Faltavam poucos dias e os
que
conheciam o Angelino e sua vida pacata, diziam
nos
jornais:
“O
Angelino
da vida rotineira e desafogada, anda agora
superlotado de serviço e de responsabilidade. Teve que deixar à margem
até os
seus galos de raça, sempre de crista levantada, na rinha. Não pensem
que estou
galhofando, imaginem, pois, que em poucos dias ele conseguiu afinar
mais de
quatrocentos discos, tarefa ingente, que poz à prova o fogo de seu
gosto, a sua
inteligência e a sua resistência física. “ .
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