Te encontro  nos 1530 kilociclos!!!

Chegou outubro e os transmissores ainda não funcionavam. Setembro tinha ido embora com a última tentativa de por no ar a emissora. Tudo estava arrumado, com o técnico da Sociedade Técnica Paulista aqui presente porém, de última hora, o mesmo teve que se deslocar para Florianópolis e o período de experiências teve que ser mais uma vez adiado. Nem os microfones ainda tinham chegado.  Quem tinha comprado rádio-receptor só para a ocasião teria que esperar um pouco mais. E continuar pagando em parcelas para a Casa Pfhaf.
No fim da primeira semana de outubro,  o engenheiro Prado, encarregado pela STP, voltou a Botucatu, trazendo com ele os aparelhos que faltavam, inclusive o microfone, para a mesa central.. Foi à Vila Maria onde os transmissores estavam já instalados em terreno cedidos à sociedade pelo senhor Petrarca Bacchi e Frederico Petri, verificou de última hora e, sob pressão da direção,   botou o transmissor de 100 watts no ar. Só então os radio- ouvintes souberam da freqüência da emissora : 1530 quilociclos.  Era o dia 4 de outubro de 1939, a exatos 90 dias após a licença ser concedida pelo Ministério, 2 anos após o primeiro pedido ao governo Federal ser indeferido e 5 anos após o primeiro contato ser estabelecido. Começava o período de experiências que iria durar até a noite da inauguração em 30 de outubro.  
Desde o início o rádio abriu-se para a atividade artística e literária. Não somente Angelino de Oliveira pontuou nesses tempos de testes, mas também nomes que iriam marcar época nos primeiros tempos do rádio na cidade. Pôr exemplo, o professor Gastão Dal Farra, que se apresentou no dia 16 de outubro, durante as experiências, com uma saudação às crianças que trabalham. Diz um ouvinte da época, senhor Egídio de Biasi,  em sua carta à emissora: “Sentindo-me orgulhoso, ao ouvir o seu discurso de hoje às 19,45 minutos na Rádio Emissora de Botucatu, saudando as creanças que trabalham, não posso deixar de vir à presença do mui digno professor apresentar os meus sinceros parabéns pelo feito, esperando de todo  coração que se repita pôr inúmeras vezes, pelo motivo da festa deste dia e pelo engrandecimento do nosso querido Botucatu”.
 
Teste para “speaker”
Agora com os microfones instalados ficava plausível pedir que os pretendentes a speaker viessem para testes. Foi Angelino de Oliveira, já diretor, quem liderou a seleção. O primeiro teste ocorreu em 4 de outubro, e os jornais assinalavam que a “voz de Botucatu está sendo ouvida com grande nitidez.... até em S. Paulo e Franca”. Exigia-se de cada concorrente que ...”além de cultura, voz radiofônica, o locutor precisa ser dotado de presença de espírito para notícias de improviso e conhecer bem as pronúncias de línguas estrangeiras para a leitura não de textos mas de simples nomes e palavras”. E pediam opiniões para os radio-ouvintes, que deveriam passá-las pelo telefone da emissora, 188. (Este telefone seria, depois, mudado para 588, ficando longo tempo assim). Naquela ocasião era editada em Botucatu uma revista de cultura chamada Orquídeas e é nela que vamos encontrar detalhes dos resultados desse concurso para locutor. No início apresentaram-se muitos botucatuenses, receberam números identificadores, mas, ao final,  apenas quatro deles foram selecionados: “Com referência ao broadcasting da PRF8, desnecessário se faz escrever muito, visto que os radio-ouvintes sabem-no perfeitamente, é selecionadíssimo. Sinão, passemos rapidamente em revista. Os locutores Gregório Fazzio Junior, Nelson Pires de Campos, Milton Mariano, Angelino de Oliveira Júnior e Amilcar Pupo Aielo, podemos chamá-los veteranos porque desde o primeiro dia que a Rádio Emissora entrou no ar, ainda em caráter experimental, atuaram os três primeiros como candidatos , respectivamente ns. 5, 8 e 1. Milton Mariano só entrou mais tarde, antes, porém, da inauguração oficial, que se deu a 30 de outubro de 1939”.  Milton Mariano, fundador deste jornal A Gazeta de Botucatu e atualmente seu articulista, em entrevista gravada afirmou ter sido escolhido para revelar o prefixo. No período de experiências, além da frequência (ligeiramente diferente da atual) ser revelada, também o foi o prefixo, que a cidade sabia ser PR, mas que ficou até a última hora para ser anunciado. Milton Mariano, já professor  em Botucatu, anunciou pela primeira vez à cidade o prefixo de sua emissora de ondas longas.   
 
Finalmente a inauguração
Às 21 horas daquele 30 de outubro – uma segunda-feira -  o pequeno estúdio e demais dependências da Moraes Barros estavam tomados, literalmente. Espremiam-se ali as figuras mais destacadas da sociedade local, ávidas para participar ou ver a inauguração da nossa PR. Um auditoriozinho estava ali montado, quase como um figurante. Populares acorreram ao pequeno local e dividiam o espaço com as autoridades do momento. Muitos não couberam e ficaram do lado de fora, nos pés da imensa escada de madeira do sobradão que alí ainda hoje está, na confluência daquela rua e a João Passos (antiga Cesário Alvim)  Ali estavam presentes o bispo local, D. Frei Luiz Maria de Santana, o senhor prefeito, recentemente empossado, engenheiro da Sorocabana, Dr. José de Carvalho Sobrinho, dr. Afrodisío Rebouças-delegado adjunto, o Antonio de Campos Melo–coletor federal,  Asdrubal Sodré-diretor dos Correios, o sr. Teixeira Guimarães, o senhor representante da Coletoria Estadual, . Renato Pires, o Delfim da Graça Cardoso e Pedro Stefanini, ambos representantes consulares de Portugal e Itália, Teófilo Lupércio e Vitorino Pereira, representando da Rádio Club de S. Manoel, o professor Possidônio Sales da Escola Profissional, o Brasil Vilaça, o sr. João de Araújo e  senhora,  o Cônego Agostinho Culturato, o pe. José Melhado de Campos, o diretor do jornal O Correio de Botucatu, Manoel Deodoro Pinheiro Machado e os diretores Pedro Chieradia e Pedretti Netto , da Folha de Botucatu. E, logicamente, a direção da nova emissora, com seu superintendente Emílio Peduti, seu diretor-gerente Olívio Nardy e seu diretor Artístico, o compositor  Angelino de Oliveira.
A direção da emissora foi buscar na intelectualidade local o apoio para o principal discurso de inauguração. Falou de início o professor Wagner, da Escola Normal. Ajeitou o microfone, tirou seu discurso já preparado em alvo papel-carta, datilografado como convinha para a ocasião e... destacou os méritos da cidade que naquela hora conquistava sua estação de Rádio: “Centro irradiador de instrução e educação, dotada de um parque industrial apreciável pela reputação de seus produtos, praça comercial de grandes possibilidades econômicas, sede de bispado desde 1908, dispondo de magnífico aparelhamento hospitalar e de instituições de caridade, sob a orientação e assistência de médicos e profissionais competentes, amparada por magistratura e advogados íntegros e não menos competentes, provida de importantes repartições publicas estaduais e federais que atendem ao seu constante progredir, núcleo numeroso e ponderável de ferroviários, Botucatu sentia a necessidade de se fazer ouvir em todos os recantos de nossa invejável pátria,  pelos seus legítimos expoentes, nas ciências, nas artes, nas letras, nas industrias e no comercio, a fim de comprovar os seus títulos de cidade cerebral “...   ...”A Diretoria da Rádio Emissora num gesto de marcante cavalheirismo, pediu-me fosse eu o mensageiro da grata notícia de sua inauguração oficial. Faço-o com indizível prazer, faço-o por dever indeclinável, faço-o por solidariedade de que devo a todas as iniciativas promissoras, creadas e realizadas em nossa terra, faço-o enfim, porque sou dos que experimentam desmedido orgulho toda a vez que posso anunciar ao generoso povo botucatuense o aparecimento de mais fator de sua grandeza”....    
Em seguida desfilaram os outros discursos, devorando minutos e vencendo horas: Olívio Nardy (de tão nervoso com a data, em seu discurso, esqueceu de agradecer a meio mundo. Fê-lo depois pelas páginas do jornal Folha de Botucatu), Dom Frei Luiz Maria de Santana,  o prefeito Carvalho Sobrinho(que havia substituído, ainda há poucos dias, o anterior,  Joaquim do Amaral Gurgel), Padre Melhado, o primeiro diretor artístico Angelino de Oliveira, a  poetisa local Vanice de Andrade Camargo (foto) e o médico, folclorista e depois historiador dr. Sebastião de Almeida Pinto.
Já passava das 23 horas quando entrou no ar o primeiro programa de estúdio, transmitido oficialmente e com caráter artístico e voltado para o entretenimento. Desfilaram então nossos artistas e o Conjunto Paraguaio, dirigido pelo professor Carlos Talavera. Estávamos  inaugurando, oficialmente, a Era do Rádio em Botucatu.
 Aí então vieram os primeiros programas de sucessos, os primeiros noticiários, os primeiros artistas, as primeiras crises. Mas estas são outras histórias e ficam para o próximo número. 





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