E
PRIMEIROS
TEMPOS: ESCOLA NORMAL OFICIAL DE BOTUCATU
Desde o final do século XIX, já com seu Grupo Escolar funcionando, a cidade passou a sonhar com uma escola pública de segundo grau, dita Escola Complementar. Não havia nenhuma escola desse tipo numa vasta região. Apoiando essa pretensão, pela imprensa de São Manuel, o advogado local e deputado pelo quinto distrito, também genro do vereador Botucatuense Cel. Rafael de Moura, João Nogueira Jaguaribe, ponderava: "afora os estabelecimentos de ensino da capital,... vêem-se as escolas complementares de Piracicaba, Campinas e Guaratinguetá, os Ginásios de Campinas e Ribeirão Preto, mas para toda Zona Sorocabana, desde São Paulo ao Itararé por um lado, ao Salto Grande por um outro e ao Urubu-punga, no Rio Paraná, só existe a escola de Itapetininga...".
Com base em argumentos desse tipo e uma constante e sólida campanha de pressão, no final do ano em 1910 conseguiu-se -utilizando contatos políticos- incluir no orçamento de 1911, verbas para criação da Escola Complementar de Botucatu. Foi uma euforia só: foguetório, banda de música, passeata com velas, como era costume na época e visita da população à casa do ex-deputado Cel. Amando de Barros, adoentado na ocasião e residindo na cidade.
E começou a luta pela instalação, o que consumiu mais alguns meses, até que, talvez pressionadas ou talvez aproveitando o momento para apressar projetos em andamento, as autoridades estaduais decretaram, em 29 de março de 1911, a transformação das Escolas Complementares em criação, em Escolas Normais Primárias, destinadas a prover o Estado com professores especiais para escolas rurais.
Nova euforia, com suprema felicidade! De novo, bafejada pela sorte, a cidade ganhava uma escola de formação secundária, superior àquela que reivindicava.
Com sua Escola Normal criada em 29 de março, a cidade recebeu o senhor Carlos Gallet no dia seguinte, inspetor que veio para escolher em que casa, disponível pelo município, as aulas iriam começar. Existiam três opções: o Clube 24 de Maio, que logo colocara sua sede à disposição da cidade (onde hoje está a Câmara), a casa do Dr. Campos Toledo, na praça 15 de Novembro e finalmente a casa onde Dom Lúcio residira, na chamada Rua da Misericórdia (hoje Restaurante Ipê). Escolheu-se esta última.
Menos de um mês depois disso, com as reformas apressadas no prédio da Rua da Misericórdia, começaram a ser nomeados os professores e o diretor. Velho conhecido, o professor Martinho Nogueira, que dirigira o nosso Grupo Escolar no século passado, voltava à cidade para assumir a direção da Escola Normal, deixando uma escola do mesmo tipo, em Guaratinguetá. E ainda vieram também os professores João Ventura Fornos, para lecionar Francês, oriundo do Grupo Escolar de Araras; Amaro Egídio de Oliveira, diretor adjunto do Grupo Escolar de Sorocaba, para as matérias de Aritmética, Álgebra e Geometria; Aires Amâncio de Moura, oriundo de Paraibuna, para as matérias de História e Geografia e finalmente Joaquim Vieira de Campos, ex-adjunto do Grupo Escolar de Guaratinguetá, para o ofício de Português.
Concomitantemente, as inscrições para os exames de suficiência -como se chamavam- foram abertas, tendo aparecido 33 rapazes e 65 moças, todos atendendo exigências interessantes: ter 14 anos, trazer o atestado de moralidade e ter sido vacinado, não sofrer de moléstia maligna ou repugnante, nem ter defeito físico ou psíquico, que o incompatibilize com o magistério; e ainda ter licença do pai e para as mulheres, ser solteira. Mulher casada, nada feito.
De 2 a 4 de maio foram os exames e aquele fim de semana a cidade novamente fez festas: uma fantástica banda vinda de Tietê tocou no coreto da praça 15 de Novembro, no mesmo dia, à noite, o Clube 24 de Maio deu um magnífico baile aos professores, autoridades e pessoas que retiraram seus convites a tempo. Era só festa... festa... festa. Tudo estava dando certo.
E as aulas começaram. A cidade reencetou uma nova luta, agora, pela construção do prédio de sua Escola Normal Primária, que funcionava precariamente em edifício cedido pelo Bispado.
E essa luta não seria fácil. Mesmo antes de ter sido criada a Escola Normal, a Câmara havia, em 20 de março, feito uma doação de 20 contos para o Estado, ajudando-o na construção de um futuro edifício. Autorizara também o prefeito a doar o terreno a ser desapropriado em local de gosto da Secretaria do Interior.
Alguns meses depois, quando a Escola Normal já começava a funcionar e contrariando os moradores da parte baixa da cidade -que desejavam ver o novo edifício construído no Largo do Rosário ou no Largo Santa Cruz- a Câmara desapropriou o espaço ao lado do Grupo Escolar "Cardoso de Almeida", que àquela altura se transformara em Grupo Modelo, anexado à Escola Normal, destinado ao trabalho de formação prática dos novos professores.
Seriam dois pavimentos, ao invés dos três previstos na planta original para outras cidades, isto porque a anexação do Grupo Escolar já existente, tornaria dispensável o terceiro andar. No primeiro oficinas, no segundo o curso Normal. E as aulas práticas seriam então ministradas ao lado, no Grupo Escolar.
O ano passa, o primeiro aniversário é comemorado, mas nada de começar a construção. É ai que, valendo-se de sua amizade com o senador Rubião Junior, o ex-deputado Amando de Barros em entrevista com o Secretário do Interior, Dr. Paulo de Moraes, pede e obtém o início das obras da Escola Normal, com a liberação de 500 contos, para tal fim. Estávamos em maio de 1912.
Outro longo ano se passa e então, autorizada pelo governo do Estado, a Câmara chamou a si a responsabilidade da construção, empreitando à firma Dinucci & Pardini a execução da obra.
Finalmente em 03 de agosto de 1913 é feita a cerimônia do lançamento da pedra fundamental, como era de costume, guardando em urna preservada para a posteridade, a ata da solenidade, moedas do país e jornal do dia, que estão ali em algum lugar, até hoje.
Mas a primeira turma de professores não seria diplomada no novo prédio. O ano de 1914 seria de trabalho e falta de dinheiro. A necessidade de novas suplementações, sempre citadas nas prestações de contas dos prefeitos, apresentadas à Câmara a cada início de ano além de uma planta enorme e cheia de detalhes, atrasaram a inauguração, que só veio acontecer em 24 de maio de 1916, cinco anos depois de iniciadas as aulas.
João Carlos Figueiroa
(Publicado originalmente em "A Gazeta de Botucatu" em 1999 e posteriormente no livro "Botucatu, História de uma Cidade" em 2004)
Desde o final do século XIX, já com seu Grupo Escolar funcionando, a cidade passou a sonhar com uma escola pública de segundo grau, dita Escola Complementar. Não havia nenhuma escola desse tipo numa vasta região. Apoiando essa pretensão, pela imprensa de São Manuel, o advogado local e deputado pelo quinto distrito, também genro do vereador Botucatuense Cel. Rafael de Moura, João Nogueira Jaguaribe, ponderava: "afora os estabelecimentos de ensino da capital,... vêem-se as escolas complementares de Piracicaba, Campinas e Guaratinguetá, os Ginásios de Campinas e Ribeirão Preto, mas para toda Zona Sorocabana, desde São Paulo ao Itararé por um lado, ao Salto Grande por um outro e ao Urubu-punga, no Rio Paraná, só existe a escola de Itapetininga...".
Com base em argumentos desse tipo e uma constante e sólida campanha de pressão, no final do ano em 1910 conseguiu-se -utilizando contatos políticos- incluir no orçamento de 1911, verbas para criação da Escola Complementar de Botucatu. Foi uma euforia só: foguetório, banda de música, passeata com velas, como era costume na época e visita da população à casa do ex-deputado Cel. Amando de Barros, adoentado na ocasião e residindo na cidade.
E começou a luta pela instalação, o que consumiu mais alguns meses, até que, talvez pressionadas ou talvez aproveitando o momento para apressar projetos em andamento, as autoridades estaduais decretaram, em 29 de março de 1911, a transformação das Escolas Complementares em criação, em Escolas Normais Primárias, destinadas a prover o Estado com professores especiais para escolas rurais.
Nova euforia, com suprema felicidade! De novo, bafejada pela sorte, a cidade ganhava uma escola de formação secundária, superior àquela que reivindicava.
Com sua Escola Normal criada em 29 de março, a cidade recebeu o senhor Carlos Gallet no dia seguinte, inspetor que veio para escolher em que casa, disponível pelo município, as aulas iriam começar. Existiam três opções: o Clube 24 de Maio, que logo colocara sua sede à disposição da cidade (onde hoje está a Câmara), a casa do Dr. Campos Toledo, na praça 15 de Novembro e finalmente a casa onde Dom Lúcio residira, na chamada Rua da Misericórdia (hoje Restaurante Ipê). Escolheu-se esta última.
Menos de um mês depois disso, com as reformas apressadas no prédio da Rua da Misericórdia, começaram a ser nomeados os professores e o diretor. Velho conhecido, o professor Martinho Nogueira, que dirigira o nosso Grupo Escolar no século passado, voltava à cidade para assumir a direção da Escola Normal, deixando uma escola do mesmo tipo, em Guaratinguetá. E ainda vieram também os professores João Ventura Fornos, para lecionar Francês, oriundo do Grupo Escolar de Araras; Amaro Egídio de Oliveira, diretor adjunto do Grupo Escolar de Sorocaba, para as matérias de Aritmética, Álgebra e Geometria; Aires Amâncio de Moura, oriundo de Paraibuna, para as matérias de História e Geografia e finalmente Joaquim Vieira de Campos, ex-adjunto do Grupo Escolar de Guaratinguetá, para o ofício de Português.
Concomitantemente, as inscrições para os exames de suficiência -como se chamavam- foram abertas, tendo aparecido 33 rapazes e 65 moças, todos atendendo exigências interessantes: ter 14 anos, trazer o atestado de moralidade e ter sido vacinado, não sofrer de moléstia maligna ou repugnante, nem ter defeito físico ou psíquico, que o incompatibilize com o magistério; e ainda ter licença do pai e para as mulheres, ser solteira. Mulher casada, nada feito.
De 2 a 4 de maio foram os exames e aquele fim de semana a cidade novamente fez festas: uma fantástica banda vinda de Tietê tocou no coreto da praça 15 de Novembro, no mesmo dia, à noite, o Clube 24 de Maio deu um magnífico baile aos professores, autoridades e pessoas que retiraram seus convites a tempo. Era só festa... festa... festa. Tudo estava dando certo.
E as aulas começaram. A cidade reencetou uma nova luta, agora, pela construção do prédio de sua Escola Normal Primária, que funcionava precariamente em edifício cedido pelo Bispado.
E essa luta não seria fácil. Mesmo antes de ter sido criada a Escola Normal, a Câmara havia, em 20 de março, feito uma doação de 20 contos para o Estado, ajudando-o na construção de um futuro edifício. Autorizara também o prefeito a doar o terreno a ser desapropriado em local de gosto da Secretaria do Interior.
Alguns meses depois, quando a Escola Normal já começava a funcionar e contrariando os moradores da parte baixa da cidade -que desejavam ver o novo edifício construído no Largo do Rosário ou no Largo Santa Cruz- a Câmara desapropriou o espaço ao lado do Grupo Escolar "Cardoso de Almeida", que àquela altura se transformara em Grupo Modelo, anexado à Escola Normal, destinado ao trabalho de formação prática dos novos professores.
Seriam dois pavimentos, ao invés dos três previstos na planta original para outras cidades, isto porque a anexação do Grupo Escolar já existente, tornaria dispensável o terceiro andar. No primeiro oficinas, no segundo o curso Normal. E as aulas práticas seriam então ministradas ao lado, no Grupo Escolar.
O ano passa, o primeiro aniversário é comemorado, mas nada de começar a construção. É ai que, valendo-se de sua amizade com o senador Rubião Junior, o ex-deputado Amando de Barros em entrevista com o Secretário do Interior, Dr. Paulo de Moraes, pede e obtém o início das obras da Escola Normal, com a liberação de 500 contos, para tal fim. Estávamos em maio de 1912.
Outro longo ano se passa e então, autorizada pelo governo do Estado, a Câmara chamou a si a responsabilidade da construção, empreitando à firma Dinucci & Pardini a execução da obra.
Finalmente em 03 de agosto de 1913 é feita a cerimônia do lançamento da pedra fundamental, como era de costume, guardando em urna preservada para a posteridade, a ata da solenidade, moedas do país e jornal do dia, que estão ali em algum lugar, até hoje.
Mas a primeira turma de professores não seria diplomada no novo prédio. O ano de 1914 seria de trabalho e falta de dinheiro. A necessidade de novas suplementações, sempre citadas nas prestações de contas dos prefeitos, apresentadas à Câmara a cada início de ano além de uma planta enorme e cheia de detalhes, atrasaram a inauguração, que só veio acontecer em 24 de maio de 1916, cinco anos depois de iniciadas as aulas.
João Carlos Figueiroa
(Publicado originalmente em "A Gazeta de Botucatu" em 1999 e posteriormente no livro "Botucatu, História de uma Cidade" em 2004)